QUANDO UM PRESÉPIO OFENDE A DEUS
Por Frei
Diego Melo, OFM
Nesses últimos dias fiquei pensando e refletindo o quanto um
presépio, uma inocente representação do nascimento de Jesus em meio aos
últimos, excluídos, criminalizados e descartados de nossa sociedade pode ser
uma grande 'ofensa a Deus, uma heresia, uma blasfêmia e um verdadeiro
escândalo'.
Fiquei pensando
que essas expressões não são de agora e nem surgiram apenas ao ver o menino
Jesus posto em meio a gente de má fama, pois esses sentimentos já brotaram há
muito tempo no coração dos fariseus, doutores e mestres da lei.
Fiquei
lembrando dos inúmeros conflitos que Jesus teve que enfrentar com aqueles
'fiscais da fé', aquelas pessoas de bem e de religião que ao olhar as suas
atitudes não conseguiam ver outra coisa senão uma grande heresia e uma ofensa a
Deus.
Era demais
aceitar aquele Jesus comendo com pecadores, se deixando acompanhar por mulheres
de má fama, protegendo viúvas, defendendo prostitutas, elogiando a atitude
misericordiosa de samaritanos pagãos ao invés dos sacerdotes do templo,
chamando a Deus de pai, pregando que quem não estava contra ele era a seu
favor.
De fato muita
gente achou que o que Jesus fazia era uma ofensa a Deus, pois ao invés do ódio
aos inimigos ela pregava o amor e a tolerância, ao invés da vingança e do ‘olho
por olho e dente por dente’ ele pregava o perdão e a reconciliação. Era uma
verdadeira blasfêmia fazer milagres e realizar curas em pleno dia de sábado,
quando a lei judaica proibia qualquer atividade naquele dia dedicado ao
Senhor..
Para quem pensa
a partir da lógia legalista e meritocrata, o presépio também é uma grande
ofensa a Deus, afinal, o menino Jesus não nasceu em um lugar luxuoso, puro e
sagrado dentro do grande templo de Jerusalém, mas veio em meio aos animais de
uma pobre estrebaria. Veio como criança pobre e indefesa e se deixou adorar por
três reis magos que não eram nada puros ou 'religiosos', pois eram astrólogos
pagãos. Atraiu primeiramente a três pastores, gente inculta, impura e que não
praticava a religião. Mais ainda, aquela criança, filha de um relacionamento
fora de um casamento, de uma jovem provinda de uma simples e desprezada cidade
da periferia do mundo, cuidada por um pai adotivo, só poderia ser 'causa de
escândalo e ofensa a Deus'.
De fato, esse
Jesus com a sua história, sua família, seu jeito de ser e suas escolhas era tão
perigoso, que em nome da moral, dos bons costumes, da religião e da ordem, o
melhor que poderia ser feito era extirpá-lo entregando-o como um malfeitor e
blasfemo. E assim o fizeram!
E hoje, mais
uma vez, esse Jesus que continua fazendo as mesmas escolhas que fez há mais de
dois mil anos, continua sendo considerado 'blasfemo', 'imoral' e
'revolucionário' demais, de modo que é melhor continuar matando-o através de
nossas pregações piegas e desencarnadas, das nossas interpretações de acordo
com as nossas conveniências, dos nossos falsos moralismos, preconceitos,
julgamentos e exclusões. É melhor deixá-lo bem quietinho e só relembrar de
contar as suas histórias e os seus feitos que muitas vezes nos causam emoção e
lágrimas e servem para anestesiar as nossas consciências, mas que em nada
provocam e mudam a nossa vida.
Esse mesmo
Jesus, sinal de ofensa a Deus, continua sendo perseguido pelos fiscais da fé e
pelas pessoas de religião, gente que na noite de Natal emociona-se ao ver a
encenação do Nascimento do Deus-menino, mas que não entende o real alcance
daquele acontecimento.
De fato, para
quem pensa a partir da lógica de um Deus que veio somente para os puros e
santos, e que só sabe punir os pecadores e castigar os maus, esse Jesus certamente
continuará sendo uma grande e irremediável 'ofensa a Deus'.
Por fim,
gostaria de lembrar o aniversário natalício do Papa Francisco. Confesso que
tenho a impressão de que para os fariseus e doutores da lei de hoje, os fiscais
da fé, também o Papa Francisco está causando grandes transtornos e escândalos
para os nossos tempos. Na minha humilde opinião, estou querendo achar que o
Papa Francisco anda imitando demais os passos de Jesus e o seu modo de ser, de
modo que ele, tal qual Jesus, já está sendo acusado de ser também um
'escândalo', um 'blasfemo' e uma verdadeira 'ofensa a Deus'.
SAIBA MAIS:
24º Exposição de Presépios no Valongo
Nota de Esclarecimento
Comentários
Gostei muito de ver escrito reflexões que estive fazendo essa semana!
Que possamos nesse Natal lembrar desse Jesus que vem para os excluídos e pecadores e não para os Mestres das Leis e Fariseus!