O desconhecido sentido do Sábado Santo
A Semana Santa é um
tempo forte para celebrarmos os mistérios mais intensos de nossa fé: a salvação
que nos veio pela vida, paixão, morte e ressurreição de Jesus. Caminhamos no
retiro quaresmal meditando sobre estes temas até chegarmos ao núcleo no “Tríduo
Pascal”: quinta, sexta, sábado e domingo. Quatro dias!
Mas tríduo não quer
dizer três? É que o dia litúrgico começa na véspera e vai até a outra véspera. Assim, a Missa do Crisma, que
acontece nas catedrais presidida pelo bispo com a presença dos padres e de
parcela representativa do povo da diocese, na quinta de manhã, marca o final da
Quaresma.
O Tríduo Pascal vai
começar na celebração da noite: a Missa do lava-pés e da instituição da
Eucaristia e do Sacerdócio. Preste atenção e verá que ela já marca o memorial
da “paixão” de Nosso Senhor Jesus Cristo. Este memorial da entrega de Cristo na
cruz ecoará até a Sexta-feira, com a sóbria celebração da paixão. Este é o
primeiro dia do tríduo.
O terceiro começará na
véspera de sábado e será o dia da ressurreição, inaugurado pela Vigília Pascal
e prolongado pelo domingo da ressurreição. Agora você pergunta: e o segundo
dia? Começa na véspera de sexta-feira até a véspera de sábado. É o dia do silêncio,
da sepultura, memorial da ausência. Não existe celebração litúrgica prevista
para este dia. Normalmente não sabemos bem o que fazer no sábado de manhã.
Parece um tempo livre, mesmo para os acostumados a viver a vida liturgicamente.
Alguns aproveitam para arrumar a casa; outros para
compensarem o jejum feito na Sexta-feira Santa.
O “sábado do silêncio”
é um tempo para deixarmos a semente repousar escondida debaixo da terra,
esperando o milagre do germinar. Nossa vida não é feita apenas de palavras, gestos e realizações.
Existe o tempo das esperas. Há momentos em que fizemos tudo o que estava ao
nosso alcance e só nos resta confiar. Por isso o Sábado Santo é o tempo
da entrega, da confiança, de colocar-se como criança no colo de Deus.
Nossa vida muitas
vezes é dominada pelo estresse e pela correria. Corremos até para comer e para
rezar. O sábado da serenidade é um tempo para celebrar sem pressa, sem
palavras, sem ritos. Se a Sexta-feira Santa é um tempo de jejum, o
sábado da paciência é momento para comer devagar e mastigar mais. Se a
Quaresma foi um tempo intenso de oração, o sábado da saudade é um
tempo de rezar sem palavras. É o momento da intimidade; de fecundar toda
solidão com a presença daquele que rompe as trevas com sua luz.
Podemos no sábado
santo nos “esconder” com Jesus no sepulcro. Liturgicamente até Deus tem
um tempo para se calar. Com isso nos ensina a não falar o tempo todo. É bom
experimentar que mesmo calado e aparentemente ausente, Deus em seu mistério
sempre está conosco. Ele nunca nos abandona. Como disse o nosso querido
papa emérito Bento XVI em maio de 2010, ao visitar o Santo Sudário, em
Turim: “No Sábado Santo aconteceu o impensável: ou seja, que o Amor
penetrou ‘na mansão dos mortos': também no escuro extremo da solidão humana
mais absoluta nós podemos escutar uma voz que nos chama e encontrar alguém que
nos pega pela mão e nos conduz para fora. O ser humano vive porque é amado e
pode amar; e se até no espaço da morte penetrou o amor, então também lá chegou
a vida. Na hora da extrema solidão nunca estaremos sozinhos”.
Pe. Joãozinho, scj
Teólogo, escritor e compositor
Fonte: Portal Canção Nova
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